Enquanto eu não viajo novamente – e enquanto não termino de organizar os posts da viagem ao Peru segundo sugestão do Ricardo Freire - decidi falar um pouco de alguns livros e dos lugares para onde eles me levam.
Descobri, há pouco tempo, Andrea Camilleri, autor siciliano de 83 anos cujo personagem mais famoso é o Comissário Montalbano. No Brasil, os livros dele são editados pela Record.
Nunca estive na Itália e nem na Sicília, mas já fui contaminada pela visão siciliana de Camilleri. Adoro as passagens em que ele fala de Montalbano e sua relação com a comida, como uma em Guinada da Vida (p.181):
“Comer ou não comer? Esse era o problema: seria mais sensato suportar as fisgadas de um apetite vergonhoso ou dizer foda-se e ir encher a pança no Enzo? O dilema shakesperiano se lhe apresentou quando, tendo consultado o relógio, ele se deu conta de que já eram quase oito. Se cedesse à fome, teria uma hora muito curtinha para dedicar ao jantar (..) Ora, uma coisa era certa: comer às pressas não era comer, mas, no máximo, se alimentar. Diferença substancial, porque, naquele momento, ele não estava precisando se alimentar como um animal ou uma árvore. Sua vontade era comer saboreando cada bocado e empregando nisso todo o tempo necessário.”
Em A Voz do Violino (p.85) temos a descrição de uma refeição:
“Primeiro veio um grande prato de macarrão com um molhinho chamado ‘fogo vivo’ (sal, azeite, alho, bastante pimentão vermelho seco) sobre o qual o comissário foi obrigado a entornar meia garrafa de vinho. Como segundo prato, uma substancial porção de cordeiro à caçadora, que exalava um gostoso perfume de cebola e orégano. Por fim, doce de ricota e um copinho de anisete, como viático e encorajamento a digestão.”
E há muito mais: os lugares, a maneira de se portar das pessoas, o jeito particular de Montalbano conduzir uma investigação e sua relação com Lívia, sua companheira que mora em Gênova.
Os livros do comissário Montalbano já editados no Brasil são (na ordem de leitura): A forma da água, O cão de terracota, O ladrão de merendas, A voz do violino, Excursão à Tindari, O cheiro da noite, Guinada na vida e A lua de papel. Adoraria poder lê-los no original, mas o meu italiano (ou seria siciliano?) não dá para tanto. A tradução de Joana Angélica d'Avila Melo me parece muito boa, com direito a nota de rodápe em alguns casos, seja para explicar melhor um prato ou expressão.
Para quem quiser saber mais sobre a Sicília, recomendo o delicioso relato da Majô, que esteve por lá em 2007, no seu blog Filigrana e que pode ser encontrado aqui.
Em tempo, a RAI fez uma série de filmes do comissário Montalbano com o ator Luca Zingaretti. Baixei alguns filmes pela internet, gostei muito da produção e do elenco, mas ainda prefiro os livros.